sábado, 28 de fevereiro de 2009

O AMIGO DA NATUREZA E O SONHO DE ADOLESCENTE

Esboço de palestra proferida no Colégio Culto à Ciência em 15 de agosto de 2008.

A família na Europa

Teve origem no Principado de Mônaco.
Era a última década do Século XVIII, durante a revolução francesa.

O pai de Hércules

Arnaud Florence nasceu em Toulouse na França.
Tinha espírito de aventureiro e aos 19 anos se alistou no Regimento Real designado para grandes viagens marítimas.
Aprendeu Medicina e Cirurgia com seu pai que era considerado um mestre.
Abraçou a causa da Revolução Francesa e defendeu os ideais da República.
Em 1792 foi recrutado como cirurgião para o 3º batalhão de voluntários de Haute Garonne.

A INVASÃO DE MÔNACO
O 3º batalhão de voluntários invadiu Mônaco em janeiro de 1793.
O Palácio foi tomado pelos militares.
O Príncipe foi deposto e proclamada a república.
Mônaco recebeu um novo nome: Forte Hércules.

Mônaco 2 de março de 1793 Nesta data Arnaud Florence, aos 44 anos de idade, se casou com Marie Augustine de Vignalli, dezenove anos mais jovem.
Ela era de família monegasca de artistas pictóricos.
Tiveram seis filhos: Claudine Herculine, Jean Baptiste, Antoine Fortuné, Emannuel, Antoine Hercule Romuald que nasceu em 1804 e Célestine que nasceu em 1805.

Em 18 de maio de 1804, Napoleão foi proclamado Imperador da França.

Na Europa

Hércules viveu em:
Nice entre 1804 e 1805
Vintimille entre 1805 e 1807
Mônaco entre 1807 e 1824.

Infância
Ficou órfão de pai antes dos quatro anos.
Denotou propensão para a arte do desenho. Herança materna e ambiente favorável.

Autodidata
Inclinado a tudo o que estava ao meu alcance aprender, eu não podia deixar de me entregar ao desenho. Eu o aprendi sem outro mestre que os modelos que tinha diante dos olhos e encorajado pelos amigos de minha mãe.
Adolescência Desenho, leitura e escrita.

DESTAQUE DE LEITURA: As aventuras de Robinson Crusoé e a obra de Abade Raynal.

Li Robinson e fiquei apaixonado pelas viagens e aventuras marítimas. Esse gosto me deu o da geografia e passava horas inteiras sobre um Atlas bom que nós tínhamos. Não havia um ponto no globo onde eu não pretendesse ir algum dia. O Mediterrâneo me parecia muito pequeno e eu apenas pretendia percorrê-lo como se percorre um lago do país antes de o deixar.
A Influência da leitura:
Robinson Crusoé despertou seu espírito de aventureiro (herança do pai).
Apaixonou-se pelas viagens marítimas.
Descobriu o gosto pela geografia.
Considerou o livro de Raynal sobre a América fascinante.

Escreveu aos quinze anos:
Partirei um dia próximo para alguma ilha deserta onde a natureza será minha única mestra, aprenderei sua linguagem, a farei cantar, anunciarei sua beleza ao resto do universo.
O novo Robinson
Brasil é sua ilha deserta.
A zoofonia, ciência que criou em 1829, é a linguagem da natureza.
O diário de viagem, publicado em 1875, anuncia a beleza da natureza.

Robinson Crusoé
Livro publicado em 1719 pelo escritor inglês Daniel Defoe.
Viajar e conhecer o mundo. Viver emoções e aventuras.
Esteve durante quatro anos no Brasil onde foi fazendeiro.
Salvador, Fernando de Noronha e Amazonas.
Foi inspirado na história verídica de Alexander Selkirk (marinheiro escocês).

O sonho de Hércules
Viagens marítimas, viagem ao redor do mundo, visitar ilhas desertas, conhecer todas as regiões da Terra.

Indo atrás do sonho

Aos dezesseis anos viajou por mar até Antuérpia (Bélgica) e voltou a pé para Mônaco.
Estudou matemática e física para se tornar marinheiro.
Entrou para a marinha francesa aos 19 anos.
Fez parte da tripulação de dois navios.
Foi convidado pelo capitão de fragata para uma viagem de volta ao mundo.

América

O capitão lhe disse: venha para a América, poderá desembarcar onde quiser.
Esta frase sugere que estava nos planos de Hércules conhecer a América (por influência de suas leituras).
A fragata partiu de Nice em fevereiro de 1824.

Imagem do passaporte do Principado de Mônaco.

1808, vinda da família real, abertura dos portos às nações amigas.
07 de setembro de 1822, independência do Brasil.

A chegada ao Brasil

Em abril de 1824 o navio aportou na baia da Guanabara onde ficou ancorado durante um mês.
A partir de maio de 1824 resolveu permanecer no Rio de Janeiro depois de conseguir emprego na loja de roupas de monsieur Pierre Dillon.

Carta para a mãe

Em carta para sua mãe revela seu projeto de vida:
Educar-se através do trabalho; progredir no estudo da ciência porque tem avidez de conhecimento; conhecer o mundo, pois é curta a duração da vida.
Na carta escreveu também:
Os verdadeiros bens da vida consistem em: simplicidade, trabalho e tranqüilidade da imaginação.

Mudança de emprego
Em maio de 1825 deixou o emprego de loja de roupas.
Quase embarca em navio de guerra francês que se encontrava ancorado no cais.
No mesmo dia começa a trabalhar na tipografia de monsieur Plancher, livreiro e editor.

Lendo anúncio
Em agosto de 1825 leu anúncio solicitando desenhista para uma expedição ao interior do Brasil.
UM NATURALISTA EM PREPARATIVOS PARA UMA VIAGEM ATRAVÉS DO BRASIL PROCURA UM PINTOR.ÀS PESSOAS QUE PREENCHAM AS CONDIÇÕES NECESSÁRIAS, ROGA-SE QUE SE DIRIJAM AO VICE-CONSULADO RUSSO.

Logo que lê o anúncio percebe que poderá prosseguir com seu sonho.
Apresenta-se no vice-consulado. Demonstra que é bom desenhista e que tem noção de cartografia. É aprovado pelo cônsul Langsdorff e contratado para a viagem.
Estaria realizando o sonho de conhecer regiões da Terra.

Langsdorff

Barão Von Langsdorff era médico e naturalista alemão.
Foi nomeado cônsul Geral da Rússia pelo czar Alexandre I.
Chegou ao Rio de Janeiro em 1813.
Em 1821 apresentou projeto sobre Expedição Científica ao interior do Brasil.
O projeto foi aprovado e recebeu apoio financeiro do Czar.
Obs. Esteve em Nossa Senhora do Desterro (Florianópolis?) entre 20/12/1803 e 04/02/1804. Escreveu no seu diário no navio: “... e assim tivemos de deixar o mais belo e rico país da terra. A lembrança de minha estada no Brasil permanecerá em minha mente por toda a vida!”

A Expedição Langsdorff

Em setembro de 1825 os expedicionários viajaram por mar do Rio de Janeiro até Santos.
Hércules esteve em Cubatão, Jundiaí, São Paulo e Campinas (Itu, salto, Porto Feliz).
No início de 1826 foi para Porto Feliz e ficou hospedado na casa de Álvares Machado durante cinco meses.
Hércules organizou a partida da expedição fluvial com o auxílio de Álvares Machado que era um entendido do assunto.
A Expedição partiu de Porto Feliz em 22 de junho de 1826
Hércules levou consigo um caderno de 236 páginas em branco para registrar seu diário.

Imagem do trajeto da expedição (mapa).

RIOS PERCORRIDOS DURANTE A EXPEDIÇÃO:

TIETÊ, PARANÁ, PARDO,
CAMAPUÃ, COXIM, TAQUARI,
PARAGUAI, SÃO LOURENÇO, CUIABÁ,
RIO PRETO, ARINOS, JURUENA,
TAPAJÓS e AMAZONAS.

GUAPORÉ, MAMORÉ, MADEIRA.

MALÁRIA

Em 1827 ficaram dez meses em Cuiabá.
Em março de 1828, ra região do Diamantino no Estado de Mato Grosso, vários membros da
Expedição foram infectados pela malária.
Os sintomas se manifestaram em Hércules no início de abril de 1828.
Por este motivo ele escreveu parte do seu diário mais tarde de memória.

SUA ARTE

Não teve formação acadêmica.
Não se valia de “modelo” de índio.
Fazia retratação fidedigna
Desenhava o que efetivamente via.
Não tentava embelezar a realidade.
Preferia estudos individuais a cenas.

APIAKÁ

Com a expedição Langsdorff Hércules ficou na aldeia Apiaká durante dez dias, a partir de 11 abril de 1828.
Foi pioneiro na retratação dos índios e na descrição dos costumes da tribo.

Imagem da aquarela: Maloca dos Apiaka no rio Arinos, abril de 1828.

Imagem das capas:
A zoophonia de Hercule Florence, por Jacques Vielliard
Pesquisas sobre a voz dos animais ou ensaio de um novo objeto de estudos oferecido aos amigos da natureza, Rio de Janeiro, tipografia Ogier, 1831, por Hércules Florence.

ZOOFONIA
•1829 - Achando-me no Rio de Janeiro de volta de uma viagem nos Estados de São Paulo, Mato Grosso e Grã Pará, com o naturalista Langsdorff, a lembrança da voz de inúmeros animais selvagens me sugere a idéia de inventar novos sinais musicais adequados, e escrevo uma memória intitulada Zoophonia.

ZOOFONIA, CANTOS, GRITOS E URROS:

Canto do jaó
Canto do tropeiro
Canto do joao corta pau
Coachar de um sapo
Grito do bugio
Canto da araponga
Canto da anhuma poca
Canto da saracura
Canto do aracuã
Canto do bem te vi
Urro da onça
Urro da onça irritada
Grito do jacaré
Grito da ariranha
Canto do surucuã
Chilro de um inseto
Grito da gaivota

Esquema : A Expedição Langsdorff leva à zoofonia que leva a criar métodos de impressão que leva à invenção da poligrafia, da fotografia, do papel inimitável, da pulvografia.
A Zoofonia de certa forma o levou a ter a primeira tipografia de Campinas.
A zoofonia que Hércules definiu como o estudo da natureza falante é, desde o século passado, conhecida como bioacústica.

Campinas, 15 de agosto de 1832.
Há 176 anos em sua casa em Campinas Hercules concebeu a fotografia.
Naquele dia lhe brotou a idéia de imprimir usando a luz do sol.
E denominou este processo de: Photographie.

Janeiro de 1833 Dia 15: creio antever que um dia será possível imprimir pela ação da luz.
Dia 20: faz sua primeira experiência fotográfica em Campinas.

03 de julho de 1833:

Queira Deus que se possa imprimir sob a ação da luz se obtendo exemplares coloridos.
A divulgação

Foi reconhecido como inventor da fotografia graças a Arnaldo Machado Florence que era neto do primogênito Amador Bueno.
Arnaldo divulgava em suas palestras, desde 1948, a invenção da fotografia por Hércules Florence.
Depois que tomou conhecimento do fato, o professor Boris Kossoy, em 1976, comprovou o pioneirismo de Hércules.


Amador Bueno Machado Florence, primogênito
Foi um dos fundadores do Colégio Culto à Ciência.
Foi professor de latim e diretor do Colégio Culto à Ciência.

Segundo Boris Kossoy Foi um dos precursores mundiais da fotografia.
Foi pioneiro da fotografia na América.
Foi pioneiro no registro do termo photographie.
Foi precursor no uso do hidróxido de amônio para a fixação da imagem.
Foi pioneiro no uso do papel na fotografia.
Realizou com sucesso o processo fotográfico em Campinas em 1833.

Na política
Tinha inclinação pelo socialismo.
Convivia com político do partido liberal.
Foi amigo do padre Antonio Feijó, um dos líderes da revolução de 1842.
Imprimiu em sua tipografia “O Paulista”, jornal dos revolucionários de 1842.

Atlas celeste pictórico

Pintou 30 aquarelas de céu mostrando as nuvens.
O Atlas contém 14 descrições de tipos de céu e se encontra no manuscrito que tem como título: “O Novo Robinson”.
Pintava os céus de Campinas.

São Paulo, 04 de janeiro de 1830

data Hércules se casou com Maria Angélica, filha de Álvares Machado.
Ele com 25 anos e ela com 16 anos.
Tiveram 13 filhos dos quais sobrevivem 8.
Maria Angélica faleceu aos 36 anos em 17/01/1850.
Hercules ficou viúvo aos 45 anos de idade com oito filhos. (Morava na fazenda Soledade).


Campinas, 04 de janeiro de 1854
Nesta data Hércules se casou com Carolina Krug.
Ele com 49 anos de idade e ela com 25 anos.
Tiveram 7 filhos e todos sobreviveram.
Carolina Krug natural da Alemanha fundou em 03/11/1863 o Colégio Florence para meninas.

Escreveu para Castro Alves

Moro a metade do tempo na roça e quisera morar sempre,
porque aprecio os matos virgens, o ar livre, o nascer e o por do sol.
Setembro de 1869


Referências
• Estevam Leon Bourroul – “Hércules Florence” - 1900
• William Luret, Colóquio em Nice, 2005
• Michel Redolfi, Colóquio em Nice, 2005.
• Leila Florence, Colóquio em Nice, 2005.
• William Luret, De Mônaco ao Brasil: Hercule Florence, viajante e inventor esquecido, Anais Monegascos, 2006.
• Boris Kossoy, Descoberta isolada da Fotografia, 2006.
• Academia de Ciências São Petersburgo fotos de Claus Meyer
• Viagem Fluvial do Tietê ao Amazonas – Hércules Florence
• Mário Carelli, À descoberta da Amazônia, 1996
• Expedição Langsdorff, Editora Alumbramento, 1988.
• GG Manizer – A expedição do Acadêmico G.I. Langsdorff ao Brasil
• Boris Komissarov, Expedição Langsdforff
• Hans Becher, O Barão Georg Heinrich von Langsdorff
• Diário de Langsdorff, editora Fiocruz
• Arilda Ines Miranda Ribeiro, A Educação Feminina
• Rubens Junqueira Villela, As paisagens do céu de Hércules Florence

(Esboço da palestra proferida no Colégio Culto À Ciência de Campinas, SP, em 15 de agosto de 2008 por Francisco A. Florence Neto)